VINICIUS SASSINE
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Dez dos 11 ministros do STF votaram pela proibição do uso do Disque 100 por pessoas contrárias à vacinação contra a Covid. Em uma votação no plenário virtual da Corte, encerrada no fim da noite desta sexta-feira (18), a grande maioria dos ministros concordou com o veto à iniciativa da ministra Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos).
O Disque 100 é o principal canal do governo federal para denúncias de violação dos direitos humanos. É por esse canal que chegam milhares de acusações de violência contra mulheres, crianças e adolescentes, idosos, pessoas com deficiência, pessoas que vivem nas ruas e população LGBTQIA+.
O ministério de Damares decidiu colocar o Disque 100 à disposição de pessoas antivacinas que se sentiam “discriminadas” por não portar o passaporte vacinal exigido por determinados estabelecimentos.
A revelação foi feita pela Folha, que mostrou a existência de uma nota técnica da pasta com ataques à vacinação obrigatória de crianças e ao passaporte vacinal. No mesmo documento, o Disque 100 foi colocado como uma opção para denúncias por parte de antivacinas que alegassem “discriminação”. A reportagem foi publicada em 27 de janeiro.
Damares endossou a nota técnica e a repassou a dezenas de autoridades federais e estaduais. O canal atendeu um “número considerável” de antivacinas, como confirmou o ministério em uma segunda reportagem publicada pela Folha, em 7 de fevereiro.
Após a primeira reportagem, partidos acionaram o STF para barrar a iniciativa e o conteúdo da nota técnica com desestímulo à vacinação da população. As ações miraram também uma nota técnica do Ministério da Saúde.
O ministro Ricardo Lewandowski, em uma decisão em 14 de fevereiro, determinou que o Disque 100 deixe de ser usado para queixas contrárias à exigência de comprovante de vacinação. Ele também determinou alteração das notas técnicas.
Lewandowski levou sua decisão cautelar ao plenário virtual do STF. A votação ficou aberta por uma semana, até a noite desta sexta (18).
Por fim, nove ministros acompanharam o voto de Lewandowski: Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Edson Fachin, Rosa Weber, Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Roberto Barroso e Nunes Marques. O único voto divergente do relator foi de André Mendonça.
Os ministros indicados pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), Nunes Marques e André Mendonça, foram os últimos a votar.
Marques deu um voto favorável ao que decidiu Lewandowski, mas “com ressalvas”, como consta no sistema de julgamento virtual.
“Há relativa urgência na medida concedida, visto que o Disque 100 também atende a uma plêiade de outras emergências, haja vista a amplitude do campo de atuação do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos”, afirmou o ministro.
“Dessa forma, a estimulação de tal canal para os casos relacionados a Covid-19 poderia ocasionar eventual congestionamento de tal serviço público”, continuou em seu voto.
Segundo Marques, qualquer violação a direitos e garantias fundamentais pode ser apreciada a qualquer momento pelo Judiciário.
“Estamos vivendo um momento de incertezas em que o medo de errar se sobrepõe à cautela necessária para a análise de temas tão sensíveis”, disse.
Mendonça negou voto favorável à medida cautelar concedida, mas afirmou que, no mérito, o voto seria no mesmo sentido do adotado por Lewandowski.
Nas notas técnicas passou a ter de constar a interpretação validada pelo Supremo, de que “a vacinação compulsória não significa vacinação forçada, por exigir sempre o consentimento do usuário”.
Porém, a obrigatoriedade pode “ser implementada por meio de medidas indiretas, as quais compreendem, dentre outras, a restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares, desde que previstas em lei, ou dela decorrentes”.
As notas também devem informar que o passaporte vacinal pode ser implementado, de acordo com suas competências, tanto pela União como pelos estados, Distrito Federal e municípios.
A nota técnica distribuída pela pasta de Damares concluía que “medidas imperativas de vacinação como condição para acesso a direitos humanos e fundamentais podem ferir dispositivos constitucionais e diretrizes internacionais”.
Além disso, na visão de integrantes da pasta, essas medidas podem contrariar princípios bioéticos, ferir a dignidade humana e “acabar por produzir discriminação e segregação social, inclusive em âmbito familiar”.
Lewandowski determinou que a pasta de Damares se abstenha de utilizar o Disque 100 fora de suas finalidades institucionais e deixe de estimular, por meio de atos oficiais, “o envio de queixas
relacionadas às restrições de direitos consideradas legítimas por esta Suprema Corte”. A decisão foi referendada pelo plenário do STF.
Depois da medida cautelar, a ministra comunicou ao Supremo que o Disque 100 interrompeu o atendimento a pessoas antivacinas.
Além disso, ela precisou apresentar ao presidente Jair Bolsonaro (PL), a 21 ministros e aos 27 governadores o recuo sobre a indicação do Disque 100 a pessoas antivacinas.
Os ofícios da ministra foram enviados ainda ao procurador-geral da República, Augusto Aras, que preside o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público); ao presidente do STF, Luiz Fux, presidente do CNJ (Conselho Nacional de Justiça); ao chefe da Defensoria Pública da União, Daniel Pereira; à Confederação Nacional de Municípios; e à Frente Nacional de Prefeitos.
Para cumprir a decisão do STF, uma nova nota técnica foi elaborada, sem menção à possibilidade de uso do Disque 100 por antivacinas.
Damares enviou esse novo documento a 52 autoridades no último dia 18. Nos ofícios, ela fez referência aos ofícios anteriores, enviados em 21 de janeiro aos mesmos órgãos e governos locais, sobre “certificado nacional de vacinação e vacinação infantil contra a Covid-19”.
A ministra afirmou nos ofícios estar cumprindo decisão judicial do STF, com envio da nova nota técnica -sem indicação do Disque 100 para antivacinas- em “retificação” à nota original.
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