(FOLHAPRESS) – As quase três décadas de governo do PSDB em São Paulo permitiram uma continuidade ímpar para o desenvolvimento de uma política educacional de longo prazo, mas essa oportunidade não fez com que as escolas públicas paulistas alcançassem a qualidade esperada para o estado mais rico do país.
Após 28 anos de gestão dos tucanos, a rede de ensino estadual continua marcada por baixos percentuais de alunos com aprendizado adequado, desafios na valorização docente, escassez de recursos direcionados à educação, além da ausência na articulação do estado com os municípios.
A única política educacional mais duradoura nesse período, o pagamento de bônus a professores de acordo com resultados, tem sido mantida apesar de estudos, inclusive do próprio governo, indicarem sua ineficácia para a melhoria do quadro.
Os tucanos deixam ainda como herança para o seu sucessor, Tarcísio de Freitas (Republicanos), um quadro de falta de professores. O estado está há nove anos sem concurso público e, nos últimos quatro anos, a gestão João Doria e Rodrigo Garcia apostou em programas que aumentaram a carga horária nas escolas, pressionando ainda mais a demanda por esses profissionais.
A última gestão também deixa para Tarcísio a tarefa de aperfeiçoar duas políticas, que foram as principais apostas para a melhoria do aprendizado, o novo ensino médio e a expansão das escolas de tempo integral.
São Paulo responde pela maior rede pública de educação básica do país, com 3,3 milhões de matrículas do ensino fundamental ao médio.
O desafio já foi maior. Em 1995, primeiro ano da era tucana, com o governo Mário Covas (1930-2001), mais de 6,5 milhões de alunos estavam vinculados às escolas da rede do estado.
A diminuição é resultado de uma redução censitária de crianças e jovens e também de um processo de municipalização de escolas de ensino fundamental.
Considerando que ensinar o esperado para os alunos e conseguir mantê-los nas escolas até o fim da educação básica são tarefas centrais de sistemas educacionais, São Paulo patina no primeiro ponto e vai um pouco melhor no desafio da permanência, quando comparado com o restante do Brasil.
O estado tem o melhor percentual do país de jovens com 19 anos que já concluíram o ensino médio, com 86,5% e contra uma média de 69,4% do Brasil. Os dados de São Paulo refletem, também, os melhores níveis socioeconômicos da sua população –pesquisas mostram que esse contexto das famílias favorece melhores resultados.
Mesmo com menos alunos sob sua responsabilidade, o governo PSDB não foi capaz de melhorar os níveis de aprendizado nas escolas estaduais e viu a superação nos últimos anos de outras redes estaduais de ensino.
Segundo dados de 2019 do Saeb (avaliação federal da educação básica), somente 7% dos alunos de ensino médio terminaram a etapa com aprendizado considerado adequado em matemática -percentual que é maior no Espírito Santo, Goiás, Rio Grande do Sul e Ceará.
Em língua portuguesa, esse índice foi de 39%. Espírito Santo, Goiás e Rio Grande do Sul conseguiram resultados mais elevados.
Nesse período, o estado também não atingiu a média de proficiência considerada adequada em português e matemática nem para os alunos que terminam o ensino fundamental nem para os que concluem o ensino médio.
Dados do Saresp (avaliação estadual do rendimento escolar) mostram que, em 2021, 96,6% dos alunos terminaram a escola sem ter aprendido sequer como resolver uma equação de primeiro grau.
Apesar de não ter alcançado os índices estabelecidos, os governos tucanos mantiveram o sistema de bonificação para professores com base em resultados educacionais implementado na gestão José Serra em 2008. A iniciativa veio acompanhada da definição de um currículo da rede, o que o Brasil só teria de maneira organizada a partir de 2017, com a Base Nacional Comum Curricular.
A bonificação por resultados tornou-se uma bandeira do partido, embora faltem pesquisas conclusivas sobre os efeitos da política no aprendizado. No caso paulista, o governo a manteve apesar de avaliações internas indicarem, por sucessivos anos, que o bônus também não tem sido capaz de promover melhorias sustentáveis.
Segundo a Secretaria da Educação estadual, desde que foi instituído, foram destinados R$ 9,5 bilhões para o pagamento do bônus. A pasta defende que, no período, foram verificadas melhorias no desempenho estadual no Saeb.
A procuradora Elida Graziane, do MPC-SP (Ministério Público de Contas de São Paulo), diz que a única política constante foi a de usar recursos educacionais para pagar aposentadorias, prática que remonta ao final dos anos 1990, foi alvo de uma CPI entre 1999 e 2000 e ainda é mantida.
Dados de 2021 indicam que o estado de São Paulo investe o equivalente a R$ 269,95 mensais por aluno do ensino médio –isso levando em conta todos os gastos, incluindo salário, merenda e transporte. É o 20º pior resultado do país, segundo valores informados pelos estados ao Tesouro Nacional e colhidos pela área técnica do MPC-SP.
O estado apresenta médias de alunos por sala maiores do que as nacionais no ensino fundamental e no médio. Também enfrenta problemas históricos de falta professores de determinadas disciplinas e de infraestrutura escolar.
“São Paulo teve um potencial ímpar, com estabilidade temporal de gestão, capacidade fiscal, melhores condições da população em termos de renda e IDH [índice de Desenvolvimento Humano], além de capacidade técnica”, diz Graziane.
Ela afirma que, sob o PSDB, o estado “lavou as mãos” de ter um projeto educacional com centralidade, ressaltando que seria possível, em tantos anos, construir uma carreira docente valorizada e estabelecer um projeto pedagógico consistente.
No início de 2022, a gestão Doria aprovou um novo plano de carreira para os professores, elevando em 73% o piso salarial da categoria, após anos sem reajuste ou com correções abaixo da inflação. Mesmo com o aumento, o estado teve dificuldades ao longo deste ano para preencher vagas de contratação temporária.
“O aumento do piso não é garantia de que o professor vá receber a remuneração prometida, já que são poucos os que conseguem preencher a jornada completa. Além disso, as condições de trabalho não melhoraram para tornar a carreira mais atraente. Os professores lidam com turmas muito grandes, problemas de violência”, avalia Andreza Barboza, pesquisadora da Repu (Rede Escola Pública e Universidade) e especialista em trabalho docente.
A educadora Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da FGV, também diz considerar que a realidade educacional paulista atualmente não está à altura do estado mais rico do país. “São Paulo tem um grande desafio que é ter uma rede enorme, maior do que muitos países, o que torna complexa a questão de São Paulo.”
Costin afirma que o estado ainda demorou muito para pensar em um regime de colaboração com os municípios. Estados mais pobres, e, portanto, com contextos mais desafiadores, avançaram nesse sentido.
O caso mais emblemático é o do Ceará, que alcançou resultados muito positivos mesmo com uma grande proporção de estudantes pobres. O estado assumiu questões como a de formação de professores dos municípios, municipalizou integralmente os anos iniciais do ensino fundamental e implementou, ainda em 2007, modelo de distribuição de impostos para municípios com base em resultados educacionais.
Em nota, a Secretaria da Educação paulista disse que os governos tucanos promoveram ao longo dessas quase três décadas uma “série de reformas estruturantes no ensino público estadual” que trouxeram “estabilidade e resultado a um sistema que estava completamente desorganizado e estagnado na metade da década de 90”.
A pasta destacou que São Paulo foi o primeiro estado a implementar o novo ensino médio, ter repassado R$ 3,5 bilhões às escolas nos últimos quatro anos, além de ter “estimulado o fortalecimento das redes municipais”, a ampliação do atendimento dos alunos com deficiência e ter aumentado em mais de cinco vezes o número de escolas em tempo integral.
“Os programas e projetos implementados ao longo dos últimos 28 anos não são propriedade de governantes ou partidos. As políticas de estado planejadas e executadas neste período são conquistas da sociedade, em especial dos estudantes, docentes e equipes escolares”, afirmou a secretaria.
PRINCIPAIS MOMENTOS DA EDUCAÇÃO NOS ÚLTIMOS 28 ANOS
JUNHO DE 2000
O governador Mario Covas fica ferido ao enfrentar um bloqueio de professores grevistas na entrada da Secretaria da Educação. Os docentes faziam greve por melhorias salariais, que não conseguiram após 44 dias de paralisação.
JUNHO DE 2015
Os professores da rede estadual de São Paulo encerram a maior greve da história, após 89 dias de paralisação, sem conseguir nenhuma proposta de aumento pelo governo Geraldo Alckmin.
OUTUBRO DE 2015
Alckmin anuncia o plano de fechar 93 escolas estaduais, no que chamou de reorganização escolar. Em um movimento inédito no país, estudantes de todo o estado ocuparam 196 unidades até que o governo suspendesse o fechamento.
ABRIL DE 2026
Estudantes de escolas públicas estaduais ocuparam a sede do Centro Paula Souza, autarquia estadual responsável pela escolas técnicas paulistas, para reivindicar melhorias na alimentação escolar e contra as denúncias de corrupção no caso que ficou conhecido como “Máfia da Merenda”.
MARÇO DE 2020
Com o avanço da pandemia em todo o país, as mais de 5.000 escolas estaduais foram fechadas e o governo implementou um sistema de ensino remoto. As aulas presenciais só foram retomadas em outubro na rede estadual, após quase seis meses de suspensão. São Paulo foi o primeiro estado a retomar as atividades.
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Artigo extraído do site Notícias Ao Minuto