Em dia de maior bombardeio de Israel contra Gaza, conflito se espalha na Cisjordânia

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O confronto entre o Exército de Israel e grupos palestinos, que desde segunda (10) atinge a Faixa de Gaza, espalhou-se nesta sexta (14) também para a Cisjordânia, causando a morte de ao menos dez pessoas.

A ampliação da violência ocorre no mesmo dia em que o governo israelense efetuou seu maior bombardeio contra Gaza desde o início da nova fase do conflito na região, num ataque que teve como principal alvo túneis usados por militantes do lado palestino. Ao mesmo tempo, o grupo radical Hamas -que controla Gaza- continua a disparar centenas de foguetes diariamente contra cidades israelenses.

O quinto dia da escalada de violência mais grave entre os dois lados desde 2014, com troca de foguetes e mísseis entre o Exército israelense e o Hamas, começou após Israel realizar, ainda na madrugada, uma ofensiva por terra, na fronteira com a Faixa de Gaza, movimento que marcou uma nova etapa do conflito.

Nesta sexta, o número de mortos em Gaza subiu para 126, incluindo 31 crianças e 20 mulheres, além de 950 feridos, segundo o Ministério da Saúde palestino. Em Israel, foram 500 feridos e oito mortos: um soldado e sete civis, incluindo duas crianças e um trabalhador indiano, de acordo com autoridades.
A contagem não inclui os dez palestinos que morreram durante confrontos contra as forças israelenses na Cisjordânia nesta sexta, depois de diversos protestos contra Israel eclodirem na região.

O temor agora é que as cenas de guerra vistas nos últimos cinco dias em Gaza e em cidades israelenses se repitam também na Cisjordânia, agravando ainda mais a situação humanitária. Nos últimos anos, raramente Israel teve que enfrentar conflitos simultâneos nos dois territórios palestinos.

Além disso, há sinais de revoltas também em países vizinhos. Um integrante do grupo radical Hizbullah foi morto por tropas de Israel ao tentar pular a cerca na fronteira entre o país e o Líbano -a região foi palco de manifestações de apoio aos palestinos durante a semana.

Atos semelhantes também aconteceram nesta sexta na fronteira entre Israel e Jordânia. O Exército israelense divulgou ainda que ao menos três foguetes foram disparados da Síria contra o país -sem deixar feridos. O comunicado não identifica qual grupo foi responsável pelo ataque.

A operação contra a rede de túneis, que o Exército israelense chama de metrô do Hamas, começou antes do amanhecer e incluiu 160 bombardeios, o uso de helicópteros e tanques, ações marítimas e disparos de artilharia realizados na fronteira com a Faixa de Gaza.

Em reação, o Hamas disparou foguetes contra o sul de Israel, mas os projéteis foram interceptados. Uma mulher e seus três filhos pequenos foram mortos em Gaza, segundo oficiais de saúde do enclave, e seus corpos foram recobertos por destroços da casa destruída pelo ataque israelense. Do outro lado, uma idosa em Israel morreu enquanto se dirigia a um abrigo para se proteger dos disparos de foguetes.

Em meio ao acirramento do conflito, esforços diplomáticos liderados pelo Egito para um cessar-fogo têm se intensificado nas últimas horas, segundo a agência de notícias Reuters e a rede de TV BBC. Apesar disso, o primeiro-ministro israelense, Binyamin Netanyahu, afirmou que a ação militar “ainda não acabou”.

“Atacaram nossa capital, lançaram foguetes contra as nossas cidades. Estão pagando e vão continuar pagando caro”, disse o premiê depois de se reunir com a cúpula militar.

O chefe da Corte Criminal Internacional alertou que indivíduos envolvidos nos confrontos podem ser responsabilizados por supostos crimes de guerra em outros momentos do conflito, e o escritório da ONU para a Coordenação de Assuntos Humanitários afirmou que há relatos de 200 habitações destruídas ou severamente danificadas, além de centenas de pessoas buscando abrigos em escolas do enclave.

Israel, por sua vez, diz se esforçar para preservar vidas de civis, fazendo avisos sobre ataques. “Nosso alvo é um sistema elaborado de túneis debaixo de Gaza, principalmente, mas não só, no norte, que o Hamas usa para se mover e se esconder”, disse o porta-voz do Exército, o tenente-coronel Jonathan Conricus.

O Hamas comanda desde 2007 a região da Faixa de Gaza e rivaliza com o Fatah, que controla a Cisjordânia e a ANP (Autoridade Nacional Palestiniana) -tradicionalmente reconhecida pela comunidade internacional como representante oficial dos palestinos. Entre a década de 1960 e o início dos anos 1990, o Fatah era considerado o principal grupo palestino e entrou diversas vezes em confronto com Israel.

Nos últimos 30 anos, porém, a correlação de forças mudou, e o Hamas passou a liderar as ofensivas contra o país vizinho, com a ANP diminuindo a participação em ações violentas. Não está claro se algum dos grupos está envolvido nos atos desta sexta na Cisjordânia.

Apesar do histórico de guerras entre o Estado israelense e grupos palestinos na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, árabes e judeus de modo geral convivem de maneira relativamente pacífica dentro de Israel, sem grandes episódios de violência nas últimas décadas.

Desta vez, porém, a situação é diferente. Diversas cidades israelenses como Haifa, Jafa, Beersheva e Lod -que ordenou, na quinta, toque de recolher das 20h às 3h- têm sido palco de atos da população árabe em apoio à causa palestina. Sinagogas foram atacadas, e conflitos eclodiram nas ruas de algumas comunidades, levando prefeitos e até o presidente a alertar sobre o perigo de uma guerra civil.

Judeus também danificaram lojas, hotéis e carros de moradores árabes. Em Bat Yam, ao sul de Tel Aviv, extremistas fizeram uma marcha na qual uma multidão atacou um palestino. Nesta sexta, Netanyahu culpou os árabes pela situação interna, mas disse que não aceitará violência de ambos os lados.

A nova fase de hostilidades foi desencadeada por confrontos entre palestinos e forças de segurança israelenses na mesquita de Al-Aqsa, em Jerusalém. A cidade, sagrada para judeus, palestinos, cristãos e muçulmanos, vive um estado de tensão desde o início do ramadã, mês mais importante para o islã.

No centro do atual conflito estão a liberdade de culto em pontos da região de Jerusalém conhecida como Cidade Antiga e uma decisão judicial que prevê o despejo de famílias palestinas do bairro de Sheikh Jarrah que, por veredito de um tribunal regional, devem devolver os terrenos a judeus.

Ativistas palestinos em Israel também afirmam ser vítimas de perseguição policial e que as forças de segurança reprimem com violência os atos árabes, embora permitam protestos de grupos judeus.

O Conselho de Segurança da ONU marcou uma reunião para o domingo (16) para discutir o agravamento da violência. O plano inicial proposto por China, Tunísia e Noruega era realizar o encontro já nesta sexta (14), mas a ideia foi vetada pelos EUA. Um dos principais aliados de Israel, o governo americano também se opôs ao longo da semana a propostas de uma declaração conjunta do Conselho para pedir o fim dos confrontos, por considerá-la “contraproducente” e “inoportuna” neste momento.

Nesta sexta, Washington voltou a afirmar que Israel tem o direito de se defender dos ataques lançados pelo Hamas, mas, numa fala direcionada ao país liderado por Netanyahu, pediu que as forças israelenses façam “todo o possível para evitar vítimas civis”.

“Palestinos -incluindo em Gaza- e israelenses merecem igualmente viver com dignidade, segurança e proteção. Nenhuma família deveria temer por sua segurança enquanto estiver em casa ou em um local de culto”, disse em um comunicado o presidente Joe Biden.

A proposta vetada pelos EUA no Conselho de Segurança da ONU exigia, entre outros pontos, que Israel respeitasse a lei internacional, interrompesse a construção de assentamentos em territórios ocupados e se comprometesse a não realizar despejos de palestinos que vivem em Jerusalém Oriental.

A posição americana foi criticada nesta sexta pela China, que acusou Washington de “ignorar o sofrimento dos palestinos”. Pequim preside o Conselho de Segurança neste mês e tem defendido os palestinos no órgão, no qual frequentemente usa o direito de veto para bloquear moções dirigidas contra aliados.

Em declaração à imprensa, a porta-voz do Ministério chinês das Relações Exteriores, Hua Chunying, considerou que Washington se opõe à vontade da comunidade internacional. “Os EUA repetem que se preocupam com os direitos dos muçulmanos […] mas ignoram o sofrimento dos palestinos”, criticou Hua.

Também nesta sexta, atos de apoio a palestinos aconteceram em diversos países de maioria muçulmana -como Bangladesh, Turquia e Jordânia. Israel, por outro lado, viu a Alemanha criticar os foguetes disparados pelo Hamas. “Trata-se de ataques terroristas que têm apenas um objetivo: matar pessoas sem fazer distinções e espalhar o medo”, disse Steffen Seibert, porta-voz da primeira-ministra Angela Merkel.

Seibert disse ainda que o governo alemão não vai tolerar ações ou manifestações antissemitas em seu território, ecoando assim declarações dadas anteriormente por Margaritis Schinas, um dos vice-presidentes da Comissão Europeia (o braço Executivo da União Europeia).

Em uma rede social, Schinas pediu que os países do bloco protejam sinagogas e outros espaços judeus de ataques. Já a França anunciou o veto à realização de uma manifestação de apoio aos palestinos em Paris, citando temores de que os atos terminassem em violência contra judeus. O presidente francês, Emmanuel Macron, conversou por telefone com Netanyahu nesta sexta e pediu o fim dos conflitos.

ESCALADA DO CONFLITO FORTALECE NETANYAHU

O atual agravamento do conflito entre judeus e árabes em Israel pode beneficiar internamente Netanyahu, que tenta se manter no cargo de primeiro-ministro. Devido ao contexto de confrontos com o Hamas, os esforços da oposição para derrubar o premiê após uma série de eleições inconclusivas arrefeceram.
Naftali Bennet, líder do partido ultranacionalista Yamina, anunciou ter abandonado as negociações para formar um novo governo com uma coalizão de siglas de centro e com partidos de esquerda.

O cenário pós-eleitoral continua basicamente o mesmo: Netanyahu teve a chance de formar um novo governo e falhou. Agora, o principal bloco de oposição a ele, liderado pelo centrista Yair Lapid, da legenda Yesh Atid, também não tem um caminho claro para reunir maioria no Parlamento de 120 membros.

Bennett disse que está abandonando as conversas por uma coalizão para priorizar um governo de união mais amplo, que atenda ao interesse da nação em tempos de crise, o que deixa em aberto a possibilidade real de uma nova eleição -a quinta em apenas dois anos, algo sem precedentes.

Analistas dizem que o colapso da parceria entre Lapid e Bennett no contexto da violência atual em Israel dá a Netanyahu tempo extra para fazer um movimento político para se manter no poder. “A partir do momento em que o fogo começou, o governo de mudança morreu, e Netanyahu, ressuscitou”, escreveu o comentarista Ben Caspit no jornal Maariv nesta sexta-feira. Lapid tem mais três semanas para formar um governo de coalizão. Um “acordo rotativo”, em que Lapid e Bennett se revezariam como premiês, foi cogitado, mas precisaria do apoio de legisladores árabes para obter maioria.

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